A Verdade: Suas opiniões resultam do fato de você prestar atenção nas informações que confirmam suas crenças e ignorar todas as informações que contradizem aquilo que você acredita.
As coincidências do dia a dia
Você está tendo uma conversa ocasional sobre filmes e alguém cita um antigo clássico, como por exemplo, O Rapto do Menino Dourado, ou qualquer outro filme antigo ou obscuro que há tempos não se ouve falar. A conversa se aprofunda no filme, você imaginam o que aconteceu com os atores, relembram algumas cenas e depois o papo segue seu rumo para outros assuntos.

Com essa enxurrada de coincidências você começa a questionar se não é uma grande conspiração do universo para te dizer alguma coisa. Um sinal vindo dos céus, seja lá com qual propósito. Mas não é. Isso é chamado de "Ilusão de Frequência".
Desde a conversa com seus amigos você fez dezenas de coisas, viu centenas de títulos de filmes na programação da TV, leu dezenas de notícias sobre cinema e celebridades, assistiu outros tantos trailers. Só que você simplesmente ignorou todas essas informações, afinal não havia nenhum conexão importante com toda a avalanche de informações que você consumiu.
Você só prestou atenção e deu importância nas informações relacionadas a O Rapto do Menino Dourado porque teve uma conversa sobre ele alguns dias antes. Provavelmente você viu centenas de referência a esse filme anteriormente e as ignorou, pois antes elas não tinham importância, o filme não estava no seu foco.
Acontece a mesma coisa quando você quer compra um carro e de repente começa a ver várias vezes o mesmo tipo de carro passando pela rua. Ou quando uma mulher descobre que está grávida e passa a ver grávidas em toda parte. Quando você terminou um relacionamento e passa a prestar atenção em todas as músicas românticas que ouve e parece que elas foram escritas pra você.
A frequência de coincidências é uma ilusão no campo da percepção, você começa a prestar mais atenção naquilo em que está interessado. Quando a ilusão de frequência passa do campo passivo para o ativo, ou seja, quando você passa a procurar aquilo que é de seu interesse, você incorpora a Tendência de Confirmação.
Distorcendo a realidade
Tendência de Confirmação é um filtro através do qual você vê a realidade de forma que ela corresponda às suas expectativas. Você passa a pensar de forma seletiva, busca por aquilo que te interessa e ignora todo o resto. O grande problema é que você pode começar a distorcer a realidade.
Existe toda uma indústria de "especialistas" que tem alicerce na Tendência de Confirmação, geralmente são pessoas de opinião forte que têm espaço na TV (Datena, pastores, Arnaldo Jabor são bons exemplos), eles oferecem a seu público sua visão de mundo embalada em uma roupagem superconvincente, se você aceita, você passa a acreditar nessa pessoa e absorver seus "argumentos" como se fossem uma verdade absoluta, ao mesmo tempo que passa a ignorar ou até mesmo atacar qualquer tipo de argumento contrário.
Não importa se esses "especialistas" estão falando a verdade ou não, isso é irrelevante, você passa a ouvi-los não para obter informação, mas para buscar confirmação de que suas crenças estão certas.
"Seja cuidadoso, as pessoas gostam de ouvir sobre aquilo que já sabem. Lembrem-se que elas ficam desconfortáveis quando você diz coisas novas. Coisas novas... bom, coisas novas nãos são o que eles esperam. Eles gostam de saber, por exemplo, notícias sobre um cachorro que mordeu um homem. Afinal, morder é o que os cachorros fazem. Eles não querem saber se um homem mordeu um cachorro porque não é assim que o mundo funciona. Em suma, o que as pessoas pensam que querem é notícia, o que realmente desejam é a normalidade. Fale para as pessoas o que elas já acreditam que seja normal, que seja verdade."
(Lord Vetinari, personagem do série Discworld, de Terry Pratchett)
Se você checar as listas de desejos de sites como Amazon.com você verá que raramente as pessoas compram livros que podem desafiar a noção de como as coisas são eu devem ser. Por exemplo, durante a eleição presidencial dos EUA em 2008, Valdis Krebs, do site orgnet.com, analisou a tendência de compras no Amazon.
Pessoas que apoiavam Obama eram as mesmas pessoas que comprava livros que eram a favor do atual presidente, enquanto pessoas que não gostavam de Obama compravam livros que criticavam o presidente. Ou seja, assim como no caso dos "especialistas" da TV, as pessoas não estavam comprando livros para obter informações novas, mas sim para confirmar suas crenças atuais.
Krebs também pesquisou sobre o hábito de agrupamento de pessoas em redes sociais durante anos e conclui o mesmo que a Tendência de Confirmação prevê: você quer estar certo sobre sua visão de mundo, então se agrupa com pessoas que tem visão de mundo similar e busca por informações que confirmam suas crenças, além de evitar quaisquer evidências e opiniões contrárias.
Meio século de pesquisas colocou a Tendência de Confirmação como um dos maiores obstáculos para a imparcialidade. No meio jornalístico, por exemplo, é necessário contar a história com o mínimo de tendencialismo, sem ignorar evidências contrárias, mas na prática observamos o contrário. Apesar de menos visível, isso também acontece no meio científico, alguns pesquisadores tendem a concluir e depois encaixar os fatos para suportarem essa conclusão, em vez de fazer uma pesquisa neutra.
"Se fosse para tentar identificar um único aspecto problemático do raciocínio humano que merece atenção sobre todos os outros, a Tendência de Confirmação teria que estar entre um dos melhores candidatos. Muito se tem escrito sobre essa questão, e parece que ela é tão forte que a pessoa é levada a se perguntar se a tendência de confirmação, por si só, pode ser responsável por uma fração significativa das disputas, brigas e desentendimentos que ocorrem entre os indivíduos, grupos e nações."
(Raymond S. Nickerson)Reeditando a memória
Em um estudo realizado por Mark Snyder e Nancy Cantor na Universidade de Minesota em 1979, um grupo de convidados lia sobre uma semana da vida de uma mulher imaginária chamada Jane. Durante essa semana Jane fazia coisas que mostravam que ela poderia ser extrovertida em algumas situações e introvertida em outras.
Alguns dias se passaram e os indivíduos foram convidados a voltar. Os pesquisadores dividiram essas pessoas em dois grupos e pediram para que ajudassem a decidir se Jane era adequada para um determinado tipo de trabalho. A um grupo foi perguntado se ela seria uma boa bibliotecária; ao outro foi perguntado se ela seria boa agente imobiliária. No primeiro grupo, as pessoas se lembravam dela como uma pessoa introvertida. No segundo as pessoas lembravam a parte extrovertida dela.
Sendo tanto introvertida quanto extrovertida ela poderia ser adequada para ambos os trabalhos, portanto seria indicada pelos dois grupos. Depois de um tempo voltaram a perguntar a esses grupos, só que trocando o trabalho. Ao grupo 1 perguntavam se ela seria boa como agente imobiliária, ao grupo 2 se seria boa bibliotecária.
Presos em sua avaliação anterior as opiniões divergiam, e ambos concluíram que ela não seria boa para aquele tipo de emprego. Ou seja, o estudo sugere que mesmo a memória é vítima de tendência de confirmação. Como na primeira pergunta eles focaram em uma característica só para fazer a indicação, essa característica é que ficou impressa na memória enquanto ignoravam a segunda característica.
Buscando aprovação e ignorando o resto
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Quase sempre as pessoas acham aquilo que querem, se sua pesquisa for guiada por suas expectativas. |
"Graças ao Google, podemos buscar imediatamente o suporte para a ideia mais bizarra que se possa imaginar. Se a nossa pesquisa inicial não aparecer os resultados que queremos, é só ignorar e tentar uma consulta diferente."
Justin OwingsUm método popular para o ensino de Tendência de Confirmação, introduzida por PC Wason em 1960, é mostrar os seguintes números para uma turma de alunos: 2, 4, 6.
Os professores então perguntam para os alunos porque eles acham que esses números estão nessa ordem. Então os alunos apresentam outros três números em determinada ordem usando a regra que eles imaginam que foi utilizada, depois apresentam uma sequência de números que segue a mesma regra. O professor deve olhar a sequência apresentada e responder com apenas "sim" ou "não".
Normalmente os estudantes "entendem" a regra e escrevem sequências como 10, 12, 14 ou 22, 24, 26 e apresentam ao professor, que vai responder se a explicação é correta ou não. Ao ver as sequência o professor responde uma sequência de "sims" e os alunos vão confirmando que eles "entenderam" qual é a regra. Mas não entenderam de verdade.
Para saber qual é a regra alguns estudantes deveria apresentar sequências como 2, 2, 2, ou 9, 8, 7, pois somente apresentando sequências que não se encaixam na regra imaginada seria possível confirmar a regra. Se houver apenas a confirmação eles não descobrem que a regra original era uma série qualquer de números em ordem crescente, como por exemplo 10, 15, 50.
O exercício é destinado a mostrar como você tende a chegar a uma hipótese e, em seguida, trabalhar para provar que essa hipótese é verdadeira, em vez de testar se a hipótese imaginada pode estar errada. Você fica satisfeito com a confirmação inicial e simplesmente não procura falhas ou exceções.
Se agrupando e protegendo

Sempre que suas opiniões ou crenças são entrelaçados com sua autoimagem você tende a defendê-las com unhas e dentes para não perder o conceito de quem você é, portanto naturalmente evita o conflito ideológico.
Ao longo do tempo, depois de acumular tantas informações que confirmam sua ideologia, em revistas, livros, TV e internet, você pode se tornar tão confiante em sua visão de mundo que ninguém mais será capaz de dissuadi-lo.
Mas lembre-se que na ciência você chega mais perto da verdade procurando evidências contrárias, nós podemos usar o mesmo método em nossa vida, para formar opiniões menos alienadas.
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Texto original: http://youarenotsosmart.com/2010/06/23/confirmation-bias