sábado, 29 de julho de 2017

Desindividualização ou Consciência de manada

O Equívoco: Pessoas que saqueiam e vandalizam em meio ao caos estavam apenas esperando uma desculpa para roubarem ou serem violentas.

A Verdade: Você é propenso a perder sua individualidade e ser absorvido pela "mente coletiva" dadas condições corretas.

Sempre que uma multidão se cria em torno de qualquer coisa, algo terrível pode ser desencadeado

Em 2001, quando uma mulher de 26 anos ficou à beira de uma ponte de Seattle, considerando a decisão de acabar com a própria vida com um salto, ela não conseguiu fazer isso em paz. Os carros começaram a passar lentamente por ela causando um engarrafamento e conforme o trânsito ficava mais pesado os motoristas, enraivecidos pelo trafego, começaram a gritar para ela "Pule logo, sua puta!". Eventualmente ela pulou.

Casos desse tipo não são incomuns.

 Em 2008, um garoto de 17 anos pulou do topo de uma prédio de estacionamento na Inglaterra após uma multidão de 300 pessoas o desafiarem a isso. Algumas pessoas tiraram fotos e filmaram antes, durante e depois do suicídio do jovem. Depois que a multidão se dissipou foi como se o "feitiço" tivesse acabado. As pessoas se afastaram tentando compreender o que acabara de acontecer, alguns espectadores ventilaram, nas redes sociais, sua indignação pelo que havia acontecido.

Em 2010, São Francisco, um homem ficou na janela de seu apartamento contemplando a altura da queda. O SF Examiner detalhou como uma multidão se reuniu abaixo dele e começou a gritar para que ele pulasse. As pessoas até twitavam sobre isso. O homem morreu na queda 15 minutos depois.
"Eu estava lá e estou traumatizado. Os caras ao meu lado estavam rindo, gritando para pular e gravaram tudo. Eu ainda sou jovem e estou no ensino médio, mas isso é algo que lembrarei para o resto da minha vida. Havia uma total falta de respeito pelo pobre homem e as pessoas estavam rindo quando ele pulou ".
- comentário deixado no SF Examiner
A polícia e os bombeiros estão bem conscientes da tendência das multidões se reunirem em cenas de suicídio em potencial e provocarem o suicida, por isso eles, muitas vezes, isolam o local para as pessoas ficarem a uma distancia segura onde os gritos seriam menos ouvidos, ou possam ser rapidamente abafados. O risco de uma "torcida" espontânea para uma pessoa a se matar é alto quando as pessoas em um grupo se sentem anônimas e/ou estão com raiva ou irritadas. É preciso apenas uma pessoa para conduzir a multidão.

Uno com a multidão

De acordo com o psicólogo David Myers, esses são os três ingredientes necessários para criar uma consciência de manada: anonimato, tamanho do grupo e exaltação. Se você perder o seu senso de si mesmo, sentir o poder de uma multidão, e então ser fisgado por uma sugestão poderosa do meio ambiente - sua individualidade pode evaporar.

Na multidão muitas pessoas conseguem manter seu senso de certo e errado, alguns conseguem manter a compostura. Muitos dos que testemunharam esse tipo de evento se sentiram terríveis sobre o acontecimento e condenaram aqueles que encorajavam os suicidas, não parando por ai e condenando toda a humanidade após ver sua capacidade de fazer tanto mal. O que essas pessoas, assim como os agitadores, não percebiam é que esse comportamento é normal e previsível.

Talvez você ache difícil de acreditar, mas esse comportamento também está dentro de você. Sob as circunstâncias certas você também pode ser um dos que gritam "Pula!". Para entender o porquê vamos dar uma olhada em algumas fantasias.

As máscaras do Dia das Bruxas

O Halloween nos Estados Unidos é um ótimo exemplo de evento em que regras e normas são quebradas à revelia. Fantasias, doces, folia e irreverencia, travessuras, ações e sentimentos ligados ao mal, a morte, e ao sobrenatural - esse é um dia que, definitivamente, as pessoas fogem de seus padrões e regras de comportamento e experimentam uma outra face de si mesmo.

Nos EUA o Dia das Bruxas chega a movimentar 6 bilhões de dólares, e 2 desses bilhões são gastos em fantasias. Em todo o país as pessoas se refugiam no anonimato e se tornam absorvidas por personagens que serão desfeitos no dia seguinte. O Halloween é divertido pois nos retira, por pelo menos um dia, o peso de nossa própria identidade, não importa sua idade. Se fantasiar é algo mágico para uma criança vestida de palhaço que estará buscando por doces, assim como é para um adulto com máscara do Guy Fawkes tomando doses de Tequila.

Fantasias de carnaval

Aqui no Brasil temos um evento que supera o Dia das Bruxas estadunidense: O Carnaval. Em quatro dias de folia os brasileiros se fantasiam, saem em blocos, se divertem, fazem loucuras e, em suma, dão um descanso para suas próprias regras internas sendo arrastados por multidões de foliões que também querem pensar pouco e se divertir muito. No carnaval tudo é permitido.

Sair fantasiado não só chama atenção para o personagem que você veste, mas também para a própria perda da personalidade que você veste no dia a dia. O Carnaval dá oportunidade de brincar com papeis e rótulos usando personagens que todos conhecemos, mas a maior fantasia não é a de pano e sim a personalidade carnavalesca que todos vestem na época, como se fosse um personagem de si mesmo no entanto mais caótico, louco ou, até mesmo, mais real. A máscara que vestimos durante o carnaval não se difere muito das máscaras que usamos no dia a dia, uma para o trabalho, uma para o relacionamento pessoal, outra para a família. Mas a imersão é diferente, o meio é diferente.

As máscaras da nossa vida

Nos já vivemos de baixo de muitas máscaras, na infância, sem controle de nossas escolhas, a personalidade vai se formando a partir de qualquer experiência, acabamos sendo como uma miscelânea das pessoas que conhecemos. Na adolescência começamos a ter mais consciência de nós mesmos e passamos a experimentar diversas máscaras para ver qual delas fica melhor (normalmente a que nos faz ser aceitos em algum grupo). Depois passamos a buscar nossa individualidade, tentamos sair da normalidade moldando nossa opinião sobre determinados temas, mudando nosso corpo através de tatuagens ou vestindo-se de forma diferente. A cada nova fase da vida vamos lapidando nossa personalidade até termos a segurança de que sabemos quem somos.

Depois da personalidade formada e fora o uso de nossas "máscaras" diárias, é no carnaval que temos a liberdade de sair completamente dos padrões e ser o que quisermos junto com todo mundo que conhecemos. De muitas formas é um evento em que experimentamos a perda de nossa individualidade.

O experimento dos doces de Haloween

Foi essa questão que, no final da década de 70, levou um grupo de psicólogos a fazer um estudo controlado da mente humana durante as festas de Halloween nos EUA. Arthur Beaman, Edward Diener e Soren Svanum viajaram para um bairro agradável em Seattle, Washington, e escolheram 27 casas que se tornariam laboratórios improvisados. Os pesquisadores queriam ver se o anonimato dos trajes de Halloween afetaria o comportamento das crianças.

Os cientistas colocaram dentro da entrada de cada casa uma tigela de doce, um espelho e uma decoração festiva de Halloween, na outra sala um cientista observava através de um buraco quando as crianças chegavam e o que faziam.

Uma mulher ficava recepcionando as crianças que chegavam pedindo doces e  falava que cada um poderia pegar um. Depois disso ela se ausentava daquela parte da casa deixando as crianças sozinhas com os doces. Na metade das vezes ela perguntava as crianças os nomes delas e onde elas moravam. Crianças que chegavam com adultos eram omitidas do resultado da pesquisa. A questão era ver se as crianças pegariam mais doces do que deveriam quando um adulto não estivesse em sua presença, afinal, assim elas não teriam que lidar com punição ou desapontamento.

As perguntas principais eram: As crianças reagem de forma diferente quando estão sozinhas ou em grupo? Ao dizer seus próprios nomes isso as lembrariam de sua própria identidade? Ou o seu próprio reflexo no espelho poderia lembrá-los de quem eram?

No fim das contas eles perceberam que o espelho não era um fator determinante. O que fez a maior diferença era se eles tinha ou não dito seus nomes e se eles estavam ou não em grupo.

Se eles tivessem que dizer seu nome e também estavam sozinhos, menos de 10% das crianças burlava a regra pegando mais doces. Quando em um grupo, cerca de 20% daqueles que revelaram sua identidade desobedeceram a regra dos doces. 20% das crianças, que não falaram seus nomes e estavam sozinhas, pegaram mais doces. Em um grupo, cerca de 60% dos anônimos aproveitaram para pegar doces a mais.

Os resultados sugeriram que o poder de seu anonimato foi ampliado na presença de outros. Sem máscaras as transgressões também subiam quando em grupo, mas com as máscaras um número muito maior de crianças pegavam mais doces. As crianças que se sentiram mais anônimas e as mais protegidas pelo anonimato compartilhado do grupo também eram as mais propensas a quebrar as regras e tomar mais doces. Com o anonimato máximo, muitas delas tentaram levar todos os doces que conseguiam carregar.

Este é um dos muitos estudos que revelam que sua identidade pode ser dissolvida na presença de outros, e quanto maior o grupo, mais propenso estamos a sermos mimetizados em prol da vontade coletiva. Saques, tumultos, linchamentos, guerras, perseguição de "monstros" com tochas, histeria coletiva. Todos nos podemos ser atraídos para dentro da manada, faz parte do nosso funcionamento, só é necessário os estímulos certo para nos tornarmos parte de algo maior, seja para o bem, ou para o mal.

O Efeito Manada

Os psicólogos chamam esse fenômeno de desindividualização. Em determinadas situações, você pode esperar ser desindividualizado. Ao contrário do comportamento social normal, em que você adota as idéias e os comportamentos dos outros para aceitação e inclusão, a desindividualização é, principalmente inconsciente, e mais provável que leve a fazer algo ruim. Como Myers disse "você faz junto o que não faria sozinho".

Lembre-se da sua adolescência, quais foram os momentos em você mais arrumou confusão? Provavelmente você estava em grupo e foi seduzido pela vontade de seus pares. Pode ter havido influenciadores, instigadores ou líderes naturais, mas, no final, todos em seu círculo provavelmente se dissolveram na mente da unidade. Quando o diretor, pai ou policial perguntou: "O que vocês estavam pensando?" Você não tinha resposta porque não havia uma. Você estava apenas reagindo, movendo-se como um rebanho.

O experimento de choque

Em 1969, o psicólogo Phillip Zimbardo fazia estudantes universitários darem dolorosos choques elétricos em outras estudantes. Metade dos estudantes que receberam choques foram selecionados aleatoriamente para usar grandes capuzes e jalecos de laboratório durante a experiência, de forma que não dava para saber quem eles eram. A outra metade ficou desmascarada e usava etiquetas revelando seus nomes. Ele disse, aos que seriam torturadores, que estudava criatividade sob o estresse e que uma mulher, do outro lado de um espelho unidirecional, era testada sobre a capacidade dos choques afetarem o desempenho criativo da mesma. As mulheres que estavam "sofrendo" os choques, eram atrizes que fingiam se contorcer de agonia.

Zimbardo certificou-se de que os sujeitos sabiam que iria doer, dando a cada um uma amostra de 75 volts de dor. Além disso, para proporcionar motivação, ele fez com que os sujeitos assistissem uma entrevista gravada com as duas atrizes que seriam "testadas" em que uma parecia amigável e doce, mas a outra parecia rude.

O psicologo não falou para meninas, de máscaras ou sem máscara, quando dar o choque, ou por quanto tempo. Mas deixou claro que elas não precisariam dar o choque se não quisessem. Além disso as meninas do experimentos não podiam conversar entre si. A doutora queria eliminar ao máximo a pressão vinda de autoridade ou por qualquer outro. Os únicos fatores em jogo foram o anonimato e a desindividualização. Em grupos de quatro, os alunos se sentaram e começaram a dar choques nas atrizes.

Em todas as baterias do experimento as mulheres que estavam encapuzadas davam duas vezes mais choque do que as que não usavam capuz. Não importava se a atriz era a legal ou a rude, cada uma delas recebeu duas vezes mais choque das encapuzadas. A cada fase do teste os choques ficavam mais longos e frequentes. Enquanto do outro lado as atrizes fingiam grande agonia.

O anonimato causado pelos capuzes permitiram um comportamento que seria socialmente inaceitável (além de ilegal). Sem o medo de conseqüências, a excitação de ter controle sobre outra pessoa, foi alimentada por si mesma. Como Zimbardo disse, a escalada foi conduzida por um loop de feedback positivo de excitação. Quanto mais davam choques, mais excitadas ficavam. Quanto mais excitadas elas ficavam, mais choques elas davam. Embora ninguém no experimento se absteve de dar choque nas atrizes, aquelas que não estavam mascaradas fizeram uma distinção entre a atriz que "merecia" sua misericórdia e a que não merecia.

Curiosamente, esse mesmo experimento foi conduzido com soldados belgas, e quando eles usavam os capuzes, eles davam menos choques nos atores. No caso, os uniformes que eles usam já promovem a desindividualização, mas os capuzes os isolaram. Entre outros soldados, eles faziam parte de uma unidade, um grupo. Sob o capuz, eles eram uma pessoa novamente (uma pessoa anônima).
"A banalidade do mal compartilha muito com a banalidade do heroísmo. Nenhum atributo é a conseqüência direta de tendências disposicionais únicas; Não há atributos internos especiais de patologia ou bondade que residam na psique ou no genoma humano".
- Phillip Zimbardo de seu livro "The Lucifer Effect"
A agressividade do anonimato

Zimbardo realizou outro experimento e, como os pesquisadores de Seattle, usou o maravilhoso anonimato incorporado do Dia das Bruxas como ferramenta. Ele observou crianças da escola primária jogarem jogos para ganhar cupons, que eles poderiam trocar por prêmios no final. As crianças podiam escolher quais jogos jogar. Alguns jogos eram competitivos, mas não agressivos, enquanto outros eram duelos individuais realmente competitivos.

As crianças jogaram esses jogos em uma festa de Halloween, tanto fantasiados quanto sem fantasia. Na primeira rodada eles jogavam sem fantasias e, quando as fantasias chegaram, as crianças jogavam novamente, mas fantasiados. Uma vez que a competição terminou, os professores disseram que outra turma precisa das fantasias, então eles jogaram mais uma vez sem estarem fantasiados.

A quantidade de tempo que as crianças passaram jogando os jogos agressivos, assim como sua agitação, empurrando e gritando, dobrou quando elas usam os trajes, passando de 42% para 86%. Quando eles tiraram as fantasias novamente, caiu para 36%. Quando estavam disfarçados, sob o feitiço da desindividualização, queriam ir de frente-a-frente e lutar, mesmo que esses jogos demorassem e rendessem menos cupons. Assim que os figurinos foram removidos, eles voltaram para um comportamento mais social.

Monstros internos?

Todas as vezes que você está com um grupo de pessoas, ou está usando uma máscara, você corre o risco da desindividualização que, muitas vezes, revela sua parte mais perversa. Quando você está visível você age como se sua reputação ou posição social estivem em jogo, portanto age de forma mais social. Quando você não tem identidade, quando você não é identificado, e está livre de represálias, as cadeias de inibição do seu cérebro são suprimidas.

Como você agiria se seus inibidores internos fossem suprimidos? Gostaria de gritar para alguém para saltar à morte enquanto tira fotos e twita sobre isso?

Imagino que nesse momento você pense que não há como você fazer tal atrocidade, mas nesse momento você é um indivíduo com cadeias sociais que equilibram tanto o mal mais sombrio quanto a bondade do seu coração. Você não pode realmente prever o que aconteceria se os três ingredientes da desindividualização fossem acionados - anonimato, tamanho do grupo e exaltação.

A exaltação pode ser causada por um discurso forte, por um show que te cause catarse, em uma multidão alegre ou raivosa, ou qualquer coisa que realmente chame sua atenção e acabe por te fisgar. Cantar, dançar e outras atividades rituais e repetitivas em grupo são particularmente eficazes para capturar nossa atenção e distrair-nos dos limites de nosso corpo ou mente.

Seu foco e resposta emocional tenta o máximo possível a manter sua personalidade mas, não apenas suas emoções são desbalanceadas na presença de uma multidão, como também a sua moral e seu senso de responsabilidade em relação às suas ações. Você não se sente responsável por seus atos, bons ou ruins, mas imagina um futuro no qual o grupo será louvado ou culpado pelo que você fez junto. É neste momento que você se sente totalmente anônimo. A individualidade, que você geralmente gosta, é suprimida, e os fatores externos de seu ambiente orientam você, e os outros, em seu grupo.

A catarse

Se você estiver em Woodstock em 1969, você pode se sentir preenchido de amor e pertencimento e sair dessa experiência com um sentimento de admiração e alegria. Se você estiver em Woodstock em 1999, você pode se sentir enfurecido e agressivo e sair da experiência com costelas quebradas e uma condenação por crime. Em cada situação, uma multidão gigante de pessoas seguiu o caminho natural para a desindividualização. Eles se tornaram parte da manada, perderam-se na multidão e a seguiram, seja lá para onde ela tenha ido.

A desindividualização geralmente é promovida em qualquer organização onde é importante reduzir a inibição e fazer com que você faça coisas que você não pode fazer sozinho. Uniformes de soldados e polícia, guerreiros que se pintam, jogadores de futebol e seus uniformes, gangues com cores e símbolos, danças e rituais, são todos mecanismo de desindividualização. As empresas gastam milhões na construção de equipes em um esforço para incutir um senso de valor desindividualizado. Festas de repúblicas ou calouradas, têm mais potencial desindividualizador do que uma festa em que ninguém se sente absorvido pelo um grupo ou protegido por suas normas.

A consciência de manada é neutra

A consciência de manada tira suas inibições, bem como o seu senso de si e o medo da responsabilidade, mas isso não é necessariamente uma coisa ruim. A mesma força que traz pessoas, de outra forma racionais, para saquear e vandalizar e invadir a Polônia também pode levar a comportamentos pró-sociais. Se você está cercado por sugestões positivas, a desindividualização pode levá-lo a se esforçar mais em uma aula de exercícios, ou entrar em um abrigo para pessoas sem-teto ou ajudar a construir uma casa.

As pessoas que se esquecem do seu senso de si e trabalham juntas para salvar uma vida, ou procurar uma criança desaparecida, mostram que é uma força neutra da vontade humana. Uma vez que a desindividualização entra em ação, as pistas do ambiente moldam o comportamento resultante. As normas da multidão, bem ou mal, substituem as normas da vida cotidiana.

Outros experimentos

Em 1979 no estado de Arkansas nos Estados unidos, Robert D. Johnson e Leslie Downing mostraram como a manipulação de fatores externos poderiam mudar o comportamento das pessoas causando desindividualização. Seu estudo era muito parecido com o de Zimbardo, em que os sujeitos foram instruídos a dar choque em outras pessoas. Em seu estudo, as pessoas que davam os choques usavam roupas de Ku Klux Klan ou uniformes de enfermeira.

Os sujeitos dos trajes KKK deram mais choques do que os grupos de controle, e aqueles em uniformes de enfermagem deram menos choques. Os psicólogos Steven Prentice-Dunn e C. B. Spivey mostraram, em uma série de estudos no final dos anos 80 e início dos anos 90, que uma pessoa desindividualizada poderia ser influenciada para doar mais dinheiro do que o normal se os fatores de seu ambiente fossem pró-sociais. A desindividualização que ocorre no Super Bowl, no sermão da igreja, na rebelião da prisão e no levante revolucionário é o mesmo - já o comportamento a seguir não é.

Todos nós somos suscetíveis

Tenha em mente o quão propenso você é a desindividualização e em que situações você é mais suscetível a ela. Qualquer coisa, desde beber compulsivamente, até cantar o hino do seu time, podem diminuir sua consciência de si mesmo. Adicione a isso a difusão de responsabilidade e anonimato que vem de estar dentro de um grupo, vivendo em uma grande cidade, sentado em uma sala escura ou vestindo uma máscara. Tudo o que é necessário é um aumento do estado de excitação para que você se torne suscetível a qualquer causa que lhe chame a atenção.

Saiba que salas de bate-papo, caixas de comentários e fóruns de mensagens também são meios eficientes na causa de desindividualização. Quanto mais anonimato um usuário é permitido, mais poderoso é o efeito de ser protegido pelo grupo. Não há melhor exemplo do que as várias "raids" feitas pelo 4chan ou reddit.

A desindividualização permeia mundos virtuais, e os resultados são incontroláveis. Faça o download do "Second Life" e passeie. Mais cedo ou mais tarde você vai acabar em uma masmorra sexual. Jogue qualquer jogo no Xbox Live, e alguém acabará por reivindicar o conhecimento carnal de sua mãe. Você pode agradecer o anonimato e a desindividualização para ambos. Você pode pedir pela volta do meteoro ao ler certo comentário na internet, mas também pode agradecer ao universo ao ler outro.

Deve-se notar que a popularidade da desindividualização nas ciências sociais provavelmente provocou uma espécie de excesso de diagnósticos ao longo das décadas. Graças a um livro, em grande parte refutado, impresso em 1895, "The Crowd: A Study of the Popular Mind" (A multidão: Um estudo sobre a mente popular), escrito por Le Bon's de Gustave, os humanos em grandes grupos costumavam ser considerados perigosos porque, a qualquer momento, argumentou, as multidões podem se despir de seu comportamento civilizado e tornarem-se enxames sanguinários, que são facilmente manobrados conscientemente por líderes carismáticos. A pesquisa mais recente sugere que Le Bon estava errado e que as multidões podem ser bastante racionais - mas, se uma sensação de perigo cai sobre um grupo de pessoas exaltadas, eles podem se tornar hostis em resposta a esse medo compartilhado.

No livro de Michael Bond, "The Power of Others", ele explica que a maioria das multidões compartilha um objetivo comum, positivo e razoável, e tendem a permanecer pacíficos se as forças policiais e outras autoridades não provocarem uma resposta defensiva compartilhada entre os membros do grupo através da violência, ameaças ou exibições de força.

As jornadas de Junho e o pato amarelo

Um ótimo exemplo da capacidade defensiva de grupo aconteceu no Brasil, no que ficou conhecido como As Jornadas de Junho. Um grupo de ativistas em prol da mobilidade urbana começaram uma manifestação contra o aumento da passagem de ônibus. A manifestação, mesmo que pequena, teve uma resposta agressiva pela polícia. Em pouco tempo as manifestações se encheram e, o que começou como uma manifestação por vinte centavos, acabou se espalhando por todo país com as mais diversas (e às vezes absurdas) pautas políticas ou não políticas. De fato essas manifestações iniciais desencadearam uma cadeia de acontecimentos tão fortes que levaram o país a maior crise política de sua história pós-ditadura.

Concluindo

Se você deseja promover a desindividualização por uma boa causa no mundo analógico ou digital, ou impedir que uma multidão fique com medo e reaja, ajude as pessoas do seu grupo a sentirem-se seguras e mantenha um ambiente pró-social. Se ao invés você quiser desencorajar a desindividualização em você e em outros, você deve eliminar o anonimato e evitar rótulos desumanizadores. Quanto mais você sentir responsabilidade pessoal, mais restrições você irá mostrar.

Ou seja se você quer fazer uma super festa caótica e desinibida, desligue as luzes, aumente a música e, se apropriado, use fantasias.

Bônus - Ótimos filmes sobre consciência de manada

A Onda

Você pode baixar o filme A Onda aqui

A Experiência
Você pode baixar o filme A Experiência aqui

2 comentários:

  1. Este comentário foi removido pelo autor.

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  2. Excelente texto! Para além do campo comportamental e psicológico, foi muito bem observado o efeito das teorias de consciência de manada dentro do cenário que desencadeou a crise política no Brasil. Seguindo o raciocínio da conclusão, abro aqui o questionamento sobre quem é que promove ou desestimula a desindividualização, o que me leva a pensar no impacto devastador que o mass media pode exercer sobre as "decisões" populares, principalmente num país onde esse poder de condicionamento está nas mãos de uma minoria burguesa, um grupo seleto de empresários que controla os veículos de mídia e as leis, instrumentalizando o medo da maioria que é a classe média e a classe baixa. Em alguns discursos do Leandro Karnal quando falou da eleição de Trump, sobre o Bolsonaro, a respeito do pensamento conservador e da "maioria silenciosa", percebe-se em última análise que tudo isso é fruto de um medo muito profundo que surge da insegurança social em função do aumento da criminalidade urbana e da crise econômica. Penso que não é atoa que os veículos de mídia nos bombardeiam com notícias de violência e tragédias o tempo inteiro, pois assim permanecemos com medo, sob tensão e portanto sob controle. O mais preocupante é concluir que assim como Karnal citou em vários registros históricos ocorridos no Brasil e no mundo, a soma de todos esses fatores cria um ambiente super propício que favorece a pior espécie de políticos: aqueles que tem grandes chances de serem eleitos se aproveitando do medo coletivo (reforçado pela mídia) para produzir seu projeto conservador.

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