terça-feira, 22 de agosto de 2017

Efeito de ancoragem - Anchoring Effect

O Equívoco: Você racionalmente analisa todos os fatores antes de fazer uma escolha determinante.

A Verdade: Sua primeira percepção permanece em sua mente, afetando percepções e decisões posteriores.

Vamos às compras


Mal você entra em uma loja de roupas e vê a jaqueta de couro mais bacana de todos os tempos!

Você pega, experimenta, olha no espelho e decide que você vai leva-la. Quando você está se contemplando no espelho você já imagina pessoas olhando para você na rua, você sempre no centro das atenções dos grupos, pretendentes aparecendo de todos os cantos querendo um pedacinho de você. Em resumo, você acredita que a jaqueta vai te dar todo o sexy appeal que você está procurando. Então você procura a etiqueta para verificar o preço: R$ 2.000.

É um valor que está acima do seu orçamento atual, você começa a voltar para onde a jaqueta estava quando um vendedor o interrompe.

- Você parece ter gostado muito dessa jaqueta.

- Sim, eu adorei, mas é cara demais para mim no momento.

- Sorte sua, pois essa jaqueta está na promoção e você pode levá-la por apenas R$1.000.

Inevitavelmente você da uma balançada. Mil reais ainda estão fora do orçamento, além disso você não precisa realmente da jaqueta, mas um desconto de R$1000 parece um ótimo negócio não é? Além disso você ficou muito bem com a jaqueta e ganhou alguns pontos positivos em aparência. Você acaba comprando e dividindo de 10 vezes no cartão sem ter percebido que você caiu no mais antigo truque do varejo.

O truque é muito antigo, você coloca o preço máximo na peça, isso cria no cliente uma ideia de que o produto vale aquele valor, então você dá o desconto e cria a ilusão de que o cliente está economizando, quando na verdade não está.

O grande truque é apresentar o preço maior primeiro, isso já cria uma expectativa de que esse é o valor real do produto, assim, para você, qualquer valor menor parece-lhe que vale a pena pagar.

Mas como essa expectativa se forma?


Para descobrirmos como funciona esse viés cognitivo responda: A população da Venezuela é maior ou menor que 65 milhões de habitantes? Mantenha essa pergunta em mente e continue a leitura.

Em 1974, Amos Tversky e Daniel Kahneman conduziram um estudo fazendo uma pergunta semelhante. Eles pediram às pessoas que estimassem quantos países africanos faziam parte das Nações Unidas, mas primeiro eles giraram uma roda da fortuna. A roda foi pintada com números de 0 a 100, mas manipulada para parar sempre em 10 ou 65. Quando a roda para de girar, eles pedem às pessoas no experimento para dizer se eles acreditavam que a porcentagem de países africanos que participam da ONU era maior ou menor do que o número que saiu na roda.

Em outro momento, eles pediam às pessoas que estimassem qual seria porcentagem real. Aqueles que viam a roda da fortuna rodar e parar no número 10, na primeira metade da experiência, presumiam que cerca de 25% da África fazia parte da ONU. Aqueles que viam a roda parar no 65 disseram que cerca de 45% dos países da Africa era integrantes das Nações Unidas. O que aconteceu foi que os voluntários da pesquisa foram enganados por um fenômeno psicológico conhecido como efeito de ancoragem.

O truque aqui é que ninguém realmente sabia a resposta, eles tinham que adivinhar sem ter nenhum palpite. Até onde eles sabiam, a roda era um gerador de números aleatórios, mas produzia algo concreto para trabalhar: um número qualquer. Então quando eles tentavam estimar eles não conseguiam ignorar esse número "aleatório" e a sua suposição sempre tinha esse número como base.

As populações dos países da América do Sul provavelmente não são números que você memorizou. Você precisa de algum tipo de sugestão ou ponto de referência. Você pesquisou seus recursos mentais para algo de valor em relação à Venezuela - a bandeira, a língua, Hugo Chavez - mas o tamanho da população não é uma informação que você guarda. O que está na sua cabeça é o número que eu expus: 65 milhões. Esse número está bem na sua frente influenciando como você responde a segunda pergunta. Quando você não tem conhecimento para embasar, você se fixa nas informações disponíveis.

A população da Venezuela é de 31 milhões de pessoas. O quão aproximada foi sua resposta? Se você é como a maioria das pessoas, você assumiu um número muito maior do que esse, provavelmente próximos aos 65 milhões que eu sugeri.

Os números gerados pela roda da fortuna, o número que eu dei e o preço de R$2.000 pela jaqueta são todos "âncoras", convidados indesejáveis na mente humana, com capacidade de mudar suas ideias. As âncoras podem fazer grandes números parecerem pequenos e fazer você criar estimativas que a longo prazo vão parecer bobas.

"Em muitas situações, as pessoas fazem estimativas a partir de um valor inicial ajustado para produzir a resposta final. O valor inicial, ou ponto de partida, pode ser sugerido pela formulação do problema, ou pode ser o resultado de uma computação parcial. Em ambos os casos, os ajustes normalmente são insuficientes ... ou seja, diferentes pontos de partida produzem diferentes estimativas, que são tendenciosas em relação aos valores iniciais."- Julgamento sob Incerteza por Kahneman, Slovic e Tversky

Você depende da ancoragem todos os dias para prever o resultado dos eventos, para estimar quanto tempo levará ou quanto vale um produto. Quanto você deve pagar pela TV a cabo? Quanto será a sua conta de luz a cada mês? Qual é um bom preço para alugar neste bairro? Você precisa de uma âncora a partir da qual comparar, e quando alguém está tentando vender algo, eles estão mais do que felizes em fornecer essa âncora. O problema é que, mesmo quando você sabe desse truque, é quase impossível ignorá-lo.

Ao comprar um carro, você sabe que não é uma transação completamente honesta. O preço real provavelmente é menor do que o que eles pedem no adesivo da janela, mas o preço da âncora ainda afetará sua decisão. À medida que você olha o veículo, você não considera quantas fábricas possui a empresa, quantos funcionários eles pagam. Você não examina diagramas de engenharia ou relatórios de lucros. Você não considera o preço do ferro ou os investimentos caros que o fabricante está fazendo nos testes de segurança. O preço que você está disposto a pagar tem pouco a ver com essas considerações porque estão tão longe de você no ponto de compra, como a população da Venezuela.

Mesmo se você fez alguma pesquisa on-line, não sabe com certeza o que o carro vale, ou o que o revendedor pagou por isso. O foco, em vez disso, é o preço de varejo sugerido pelo fabricante, e não importa quão irreal seja, você não consegue tirá-lo da sua mente. Quando você pechincha o preço, você está se afastando da âncora, e você e o negociante sabem disso.

Até o número do seu CPF pode definir o quanto você quer pagar


Drazen Prelec e Dan Ariely realizaram um experimento no MIT em 2006, onde fizeram um estranho leilão. Ariely, em seu livro Previsivelmente Irracional, conta que os pesquisadores levaram uma garrafa de vinho, um livro ou um mouse sem fio e depois descreveram em detalhes o quão impressionante eram esses produtos. Então, cada aluno teve que anotar os dois últimos dígitos de seu número de CPF como se fosse o preço do item. Se os dois últimos dígitos fossem 11, então a garrafa de vinho tinha um preço de R$11. Se os dois números fossem 88, o mouse sem fio era de R$88.

Depois de anotar o preço aparente, eles começaram a dar os lances. Com certeza, o efeito de ancoragem confundiu sua capacidade de avaliar o valor dos itens. As pessoas com altos números de CPF pagaram 346 por cento mais do que aqueles com números baixos. As pessoas com números de 80 a 99 pagaram em média R$26 pelo mouse, enquanto aqueles com 00 a 19 pagaram cerca de R$9.

"Os números de CPF foram a âncora neste experimento apenas porque os pedimos. Poderíamos ter pedido a temperatura atual ou o preço de varejo sugerido pelo fabricante. Qualquer dúvida, de fato, teria criado a âncora. Isso parece racional? Claro que não."- Dan Ariely de seu livro, "Previsivelmente Irracional"

Os pesquisadores do leilão realizaram outro estudo no qual pediram que as pessoas ouvissem sons irritantes por dinheiro. Os pesquisadores inicialmente ofereceram 90 centavos ou 10 centavos para uma explosão de horríveis gritos eletrônicos, e então eles perguntaram aos voluntários qual seria o menor valor possível para passar por aquela pequena tortura novamente. As pessoas que receberam 10 centavos disseram que não receberia menos de 33 centavos para continuar.

As pessoas que ganharam 90 centavos disseram que queria pelo menos 73 centavos. Eles repetiram o experimento de outras maneiras, mas não importa como eles mexeram com os sons ou os pagamentos, aqueles que foram oferecidos pela primeira vez um pagamento baixo concordaram consistentemente em menores valores do que aqueles usados ​​para melhorar os pagamentos. As pessoas que receberam mais dinheiro no início não estavam dispostas a aceitar menores pagamentos depois.

O vício da ancoragem


Se você comprar um carro novo, ou uma casa grande, um bom computador ou um smartphone caro, você fica ancorado e tem dificuldade em adquirir qualquer desses produtos que seja inferior a um que você já teve, mesmo que seja necessário. Aqueles que compram bolsas caras sabem que estão sendo enganados, pelo menos em algum nível, mas o efeito de ancoragem ainda atinge sua conta bancária. Psicologicamente somos incapazes de ao menos pensar em ter um estilo de vida mais baixo que o nosso estilo de vida atual, pois já colocamos nossa âncora nele, não é atoa que muitos milionários que faliram continuam esbanjando, mesmo com uma dívida monstruosa.

Uma bolsa de Louis Vuitton de R$1000 tem mais utilidade do que uma bolsa de R$25 da Wal-Mart? Não. Mesmo que fosse feita de couro de girafa e costurada artesanalmente por leprechauns mágicos, é apenas uma bolsa. Mas a âncora está configurada. As bolsas de Louis Vuitton são caras, e isso em si tem valor social. As pessoas ainda as compram e estão felizes com a compra. Se a Wal-Mart oferecesse uma bolsa em R$1000, ela ficaria na prateleira para sempre. O preço seria tão distante das âncoras já estabelecidas pela loja que pareceria um absurdo. Mas se você pega essa bolsa de R$25 do Wal-Mart e coloca a venda por R$800 numa loja de grife, algumas pessoas vão comprá-la felizes por terem feito um bom negócio.

Ancoragem do bem


Como a maioria dos fenômenos psicológicos, a ancoragem pode ser usada para manipular pessoas, mas não só para o mal. Em um estudo de 1975 feito por Catalan, Lewis, Vincent e Wheeler, os pesquisadores pediram a um grupo de estudantes que se ofereçam como supervisores de campo, por duas horas por semana durante dois anos. Todos disseram que não. Depois disso os pesquisadores perguntaram se eles se voluntariariam para supervisionar uma única viagem de duas horas, metade aceitou supervisionar a viagem.

Em outro grupo eles não mencionaram o serviço de 2 horas por semana por dois anos e pediram apenas para quem acompanhassem a viagem de duas horas, nesse caso apenas 17% concordou em supervisionar a viagem. Ou seja, ao exagerar no primeiro pedido os pesquisadores conseguiram mais adesão no segundo.

Ancoras internas


Sua decisão ou cálculo inicial influencia muito todas as escolhas que se seguem, em cascata, cada uma amarrada às âncoras definidas anteriormente. Muitas das escolhas que você faz todos os dias são repetições de decisões passadas, você segue o caminho criado pelo seu eu anterior. As âncoras externas, como os preços antes de uma venda ou pedidos ridículos, são óbvias o suficiente, você até consegue ver além da ancoragem e não cair no truque. Mas as âncoras internas, auto-geradas, não são tão fáceis de ignorar.

Você visita o mesmo circuito de sites todos os dias, come basicamente a mesma coisa durante o dia. Quando precisa concertar o carro já tem seu mecânico favorito. Quando precisa comprar uma roupa nova já sabe quais lojas procurar. Na eleição você sabe em quem votar ou não votar. As âncoras antigas controlam suas decisões atuais.

Quando você está gastando seu dinheiro, tenha em mente que o vendedor sabe que você não é tão inteligente quanto pensa e usa o efeito de ancoragem dizendo você está economizando ao comprar.

Bônus - A Máscara Indígena


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Post original: https://youarenotsosmart.com/2010/07/27/anchoring-effect/

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